sexta-feira, 15 de março de 2013

RENÚNCIA DE BENTO XVI: MOMENTO DE SER FRANCISCANO

O dia 11 de fevereiro de 2013 passou à história não somente como mais uma memória da aparição de Nossa Senhora em Lourdes (1858) ou da Conferência de Yalta (1945) com a qual as potências concordavam em terminar a segunda guerra, mas foi sinalizado com um fato que ofuscou até o noticiário brasileiro do carnaval: a renúncia do Papa Bento XVI ao ministério petrino. No momento da renúncia, a minha comunidade estava reunida para a lectio divina e eu recebi a notícia imediata através de uma mensagem no celular. A minha reação foi aquela mais comum de todos os mortais: não acreditar. Assim foi também a reação dos cidadãos do lugar de nascimento de Bento XVI, que pensaram que era uma brincadeira de carnaval. Depois de um primeiro momento de ceticismo, dado à insistência do meu interlocutor, fui conferir e vi que todas as agências de notícias da Itália só falavam disso. Desde aquele momento esse é o assunto do mundo, com diversas leituras apropriadas ou não. Fundamentalmente, olhando a repercussão pelo mundo, encontrei três reações à renúncia: a hierarquia da Igreja (os bispos) apoiaram e respeitaram a decisão do Papa, os meios de comunicação começaram a buscar o motivo da renúncia e especular sobre a sucessão, e os fiéis leigos mais simples ficaram desesperados, pensando que a Igreja vive uma crise. Buscaremos esclarecer um pouco estas questões a partir de nossa visão cristã e franciscana. Antes, porém, devemos admitir que são tantas as especulações em torno dessa renúncia que começamos o nosso caminho buscando dar clareza a essas para depois enfrentar aquelas. Alguns meios de comunicação dizem que este é o segundo papa a renunciar e outros dizem que este é o quinto. Qual posição é verdadeira? Curiosamente devo dizer que uma ou outra é valida, mas pessoalmente sustento a primeira. Para compreender esta suposta discrepância, devemos admitir que uma instituição com mais de dois mil anos não pode ser avaliada pelo critério de história de hoje, que se interessa por datas e medidas. Daí que encontramos na lista dos papas diversas questões que fazem ser difícil precisar não só a data do pontificado, como o motivo do término e até mesmo a lista é sujeita a mudança. Para resolver a primeira questão prefiro ter em consideração a lista oficial dos papas, já que a lista muda de um historiador a outro. Os papas que geralmente são considerados como aqueles que renunciaram são quatro: S. Ponciano (230-235), Bento IX (1032 a 1048, sendo Papa por três vezes), S. Celestino V (1294) e Gregório XII (1406 a 1415), porém o problema é que do primeiro não temos registros históricos válidos da sua renúncia; Bento IX é uma história curiosa porque foi papa por três vezes, duas vezes foi deposto e não se tem certeza se chegou a renunciar na terceira vez; já a renúncia de Gregório antipapa foi para terminar com o cisma do ocidente (eleição), e neste caso renunciaram ele e todos os outros antipapas para que si fizesse a eleição de um novo para voltar a sede a Roma. Assim, dos quatro mencionados, o único que não paira uma dúvida sobre a renúncia é a de Celestino V, um papa que teve uma importância grande para os espirituais franciscanos. Por motivo dessa única certeza, eu me uno a tantos sérios historiadores para dizer que vivemos a segunda renúncia de um papa. Uma outra questão que se põe é como será o processo de sucessão. As perguntas que se ouvem sobre este ponto é sobretudo de caráter politico. Seguramente este aspecto é e deve estar sempre presente nas relações humanas, mas nós pessoas de fé, não podemos cair nesta armadilha. Tivemos um conclave há pouco tempo, em 2005, e o processo será muito semelhante àquele, excluso obviamente o funeral do papa e o fato que, por decisão de Bento XVI, o papa deve ser eleito, em qualquer escrutínio, com dois terços dos votos. João Paulo II tinha determinado que depois da décima votação bastava a maioria absoluta. Portanto a partir do dia 28 de fevereiro de 2013, às 20 horas do Vaticano, com a Sé de Roma vacante, o cardeal Tarcísio Bertone, carmelengo da Santa Romana Igreja, assume o governo interino da Igreja e o Cardeal Ângelo Sodano, decano do colégio cardinalício, assume a missão de convocar e presidir a eleição do novo pastor da Igreja. Um adágio famoso diz que no conclave, quem entra papa sai cardeal! Portanto qualquer suposição sobre candidatos é perda de tempo. Agora podemos avaliar as repercussões da notícia. Comecemos por recordar que em 2005, com a morte de João Paulo II, tantos falavam da impossibilidade de substituí-lo e hoje se vê que era drama de um momento histórico. Recordemos que uma comunidade que sobreviveu à grande crise da morte e depois ascensão de seu fundador – Jesus Cristo – dificilmente desmoronará com uma sucessão ou renúncia do papa. Acho um drama desproporcional a leitura de crise que se faz nesse momento, e um desconhecimento da história da Igreja que passou vitoriosa por tantos outros momentos. Portanto, nesta questão, menos drama e mais fé. Os meios de comunicação me fazem feliz pelo fato de ver como a questão religiosa, mesmo que perseguida, tem grande importância no nosso tempo. Mas rejeito a insistente pergunta que busca encontrar um outro motivo para a renúncia, além daquele que disse o papa: sentindo-se de idade avançada, não se vê em condições de conduzir a Igreja em um mundo com tantas mudanças. Pretender outras respostas é entrar num mar de suposições sem fim. Afinal, para mim que tenho a graça de conviver com anciãos da idade do papa, não precisa buscar outros motivos, basta ver que são pessoas que, ainda que boas, não conseguem mais gerir a própria vida, muito menos assumir o governo da diversidade da Igreja. A posição mais sóbria penso que encontro na hierarquia da Igreja: viver este momento com sobriedade e no limite daquilo que o papa nos disse em poucas palavras. Não vivemos uma crise, mas um momento de parar para recomeçar, com a graça de Deus e na certeza, como dizia o Senhor a Francisco, que esta não é obra nossa, mas d’Ele. >>>Quem tem a graça de conviver com a pessoa de Ratzinger, diz sempre que é um homem gentil, simples e inteligente, a sua renúncia se encaixa muito bem neste perfil. Vale recordar que no seu breve pontificado teve gestos de amor para com o Brasil: escolheu Aparecida para ser a sede da V Conferencia dos bispos de América Latina e escolheu o Rio para ser sede da JMJ. Quando o encontrei em Assis em 2007 ele me disse que o Brasil tinha sido a sua experiência mais bela. Creio que a renúncia ao poder é uma coisa que somente tem coragem de fazer uma pessoa de Espirito, afinal quantos anciãos se ligam sempre mais ao poder. A isto se acrescenta a grandeza de assumir o próprio limite, rompendo a tendência que temos de pensar-nos onipotentes. Ao legado de Bento XVI, se acrescenta agora este último, que depois de quase 800 anos sem uma renúncia de Papa, deve dizer a nossa Igreja e não somente ao bispo de Roma, que, em uma sociedade onde se tende a viver sempre mais, o bem da Igreja está acima dos nossa projetos pessoais, e que por isso, como disse o papa, ele tem o direito e até o dever de renunciar. Se isto nos servirá de testemunho, já conseguimos fazer uma leitura cristã e franciscana deste momento, ou seja profética. (Publicado na Revista Irmao Menos, Fraternidade Sao Francisco da OFS de Brasilia)

segunda-feira, 16 de maio de 2011

Ser peregrino e viandante

Hoje, 16 de maio de 2011, se fazem dois anos que cheguei em Camposampiero, a menor cidade onde já vivi na minha vida, com cerca de seis mil habitantes.
Viver em uma outra cultura, com outra língua, outro tudo. Ser o estranho do ninho, o estrangeiro, ou, como dizem aqui, o extra-comunitário, é ocasião de sofrimento para a maioria das pessoas, mas devo confessar que me faz muito bem esta nova experiência. Viver no exterior é ter a possibilidade de renascer sob muitos aspectos da vida, e se se vence a resistência ao outro, se consegue aprender muita coisa.
Recordo-me que nos primeiros dias tudo era novo, talvez interessante, media tudo a partir do Brasil. No contacto com os brasileiros, e com outros, vejo que o segundo momento é aquele de começar a mistificar tudo que é da própria pátria, ai o Brasil começa a não ter problemas e tudo daqui já não vale mais. Busquei escapar desta tentação e manter um olhar critico com a minha cultura, mas sou sabedor que isto é praticamente impossível, pois avalio a minha cultura com o coração (sou sujeito dela), enquanto avalio a Itália com a razão (ela è objecto).
A graça de Deus fez com que hoje eu sinta a Itália, na sua diferença com o Brasil, como a minha segunda pátria. Com isto não quero que ninguém se encha de poesia sobre o tema, porque a maioria dos estrangeiros vivem a experiência italiana como uma cruz. Digo sempre que é algo muito estranho, pois praticamente nunca encontrei uma pessoa que viva na Itália porque gosta, mas sim porque deve viver. E isto acontece porque aqui sefaz uma distinção cada vez mais rígida entre aquele que é daqui e aquele que é de fora, e tal distinção não faz parte do modo de ser do brasileiro: somos um povo nascido do encontro de muitas culturas.
Nos primeiros dias que aqui cheguei, eu era muito atento à situação do estrangeiro na bíblia: como o povo de Israel se pensava como único escolhido e Deus lhes exigia de darem atenção ao estranho, depois no segundo testamento se diz que todos somos estrangeiros, porque a nossa pátria é o Céu; ao passo que todos somos concidadãos. Poder antecipar esta experiência do ser “forasteiro e viandante” era para mim muito interessante, além do que comecei a me sentir profundamente livre, porque não devia representar um papel diante de ninguém: era somente o forasteiro brasileiro, sem obrigação de falar bem, de falar bonito e de representar nada.
Tudo isto me fez buscar e alcançar uma vivência tranquila com o povo italiano e seu modo de ser. Cada vez mais me convenço que a cultura é um elemento determinante e condicionador daquilo que somos, ao passo que além dela está o ser humano, na sua grandeza e limitação comum a todos os povos. Vivo assim a serenidade de buscar encontrar um irmão e uma irmã em cada um, mais que um membro desta ou daquela nação. Outros dois elementos tranquilizadores para mim é saber que estou aqui por uma tempo determinado e ter a possibilidade de celebrar uma vez por mês com meus conterrâneos brasileiros em Mantua.
Dois anos se passaram, e este é para mim tempo de graça e salvação. Por tudo isto louvado seja Deus!

sexta-feira, 13 de maio de 2011

Nota da CNBB a respeito da decisão do Supremo Tribunal Federal quanto à união entre pessoas do mesmo sexo

Nós, Bispos do Brasil em Assembleia Geral, nos dias 4 a 13 de maio, reunidos na casa da nossa Mãe, Nossa Senhora Aparecida, dirigimo-nos a todos os fiéis e pessoas de boa vontade para reafirmar o princípio da instituição familiar e esclarecer a respeito da união estável entre pessoas do mesmo sexo. Saudamos todas as famílias do nosso País e as encorajamos a viver fiel e alegremente a sua missão. Tão grande é a importância da família, que toda a sociedade tem nela a sua base vital. Por isso é possível fazer do mundo uma grande família.

A diferença sexual é originária e não mero produto de uma opção cultural. O matrimônio natural entre o homem e a mulher bem como a família monogâmica constituem um princípio fundamental do Direito Natural. As Sagradas Escrituras, por sua vez, revelam que Deus criou o homem e a mulher à sua imagem e semelhança e os destinou a ser uma só carne (cf. Gn 1,27; 2,24). Assim, a família é o âmbito adequado para a plena realização humana, o desenvolvimento das diversas gerações e constitui o maior bem das pessoas.

As pessoas que sentem atração sexual exclusiva ou predominante pelo mesmo sexo são merecedoras de respeito e consideração. Repudiamos todo tipo de discriminação e violência que fere sua dignidade de pessoa humana (cf. Catecismo da Igreja Católica, nn. 2357-2358).

As uniões estáveis entre pessoas do mesmo sexo recebem agora em nosso País reconhecimento do Estado. Tais uniões não podem ser equiparadas à família, que se fundamenta no consentimento matrimonial, na complementaridade e na reciprocidade entre um homem e uma mulher, abertos à procriação e educação dos filhos. Equiparar as uniões entre pessoas do mesmo sexo à família descaracteriza a sua identidade e ameaça a estabilidade da mesma. É um fato real que a família é um recurso humano e social incomparável, além de ser também uma grande benfeitora da humanidade. Ela favorece a integração de todas as gerações, dá amparo aos doentes e idosos, socorre os desempregados e pessoas portadoras de deficiência. Portanto têm o direito de ser valorizada e protegida pelo Estado.

É atribuição do Congresso Nacional propor e votar leis, cabendo ao governo garanti-las. Preocupa-nos ver os poderes constituídos ultrapassarem os limites de sua competência, como aconteceu com a recente decisão do Supremo Tribunal Federal. Não é a primeira vez que no Brasil acontecem conflitos dessa natureza que comprometem a ética na política.

A instituição familiar corresponde ao desígnio de Deus e é tão fundamental para a pessoa que o Senhor elevou o Matrimônio à dignidade de Sacramento. Assim, motivados pelo Documento de Aparecida, propomo-nos a renovar o nosso empenho por uma Pastoral Familiar intensa e vigorosa.

Jesus Cristo Ressuscitado, fonte de Vida e Senhor da história, que nasceu, cresceu e viveu na Sagrada Família de Nazaré, pela intercessão da Virgem Maria e de São José, seu esposo, ilumine o povo brasileiro e seus governantes no compromisso pela promoção e defesa da família.

Aparecida (SP), 11 de maio de 2011

Dom Geraldo Lyrio Rocha
Presidente da CNBB
Arcebispo de Mariana – MG

Dom Luiz Soares Vieira
Vice Presidente da CNBB
Arcebispo de Manaus – AM

Dom Dimas Lara Barbosa
Secretário Geral da CNBB
Arcebispo nomeado para Campo Grande - MS

terça-feira, 10 de maio de 2011

Quando a morte fala mais alto…

Nestes dias estou, ingenuamente, assustado com a repercussão que teve a morte de Osama Bin Laden. Ingenuamente, porque não seria de se esperar de mim tal susto, mas o problema que se criou foi a coincidência de épocas e fatos: Páscoa, beatificação de João Paulo II e morte de Bin Laden.
A morte continua sendo o grande enigma da vida humana. No passado, para chegar a uma resposta sobre o tema, os seres humanos apelavam para a reencarnação ou outra explicação espiritualizante. Com o advento do cristianismo, ouvimos o discurso claro da ressurreição. Na verdade, como vemos no Segundo Testamento, esse é o novo e insistente anúncio da Igreja: Ele vive! Atualmente, o enigma continua a bater em nossa porta e depois de séculos de vida cristã, chama-me a atenção que a nossa evangelização ainda se mostra falha, sobretudo neste aspecto.
Vejamos dois exemplos: Uma pesquisa internacional mostra o Brasil como a nação não muçulmana onde mais se acredita em Deus. Por outro lado, o Brasil está entre as nações que mais crê em reencarnação e somente cerca de metade dos brasileiros acredita na ressurreição. Se isto já entristece, saibamos que entre os freqüentadores habituais da missa dominical na Itália, somente 30% acredita na ressurreição de Jesus. Falhamos naquilo que é mais inquietante na vida humana (o fim da vida, a morte) e naquilo que é essencial no cristianismo, a ressurreição. Se não conseguimos convencer que há vida pós morte, como fazer para anunciar que o evangelho traz vida já nessa nossa existência terrena?
A noticia que chama a atenção no mundo de hoje é aquela sobre morte (violência) e prazer (sexo, magia). Basta ver quais filmes fazem sucesso e que literatura mais se vende. Por esse motivo tem mais repercussão a morte de Bin Laden que a Páscoa do Senhor ou a vida doada de João Paulo II. Afinal o que é a vida, o amor, a doação, diante do espetáculo de uma super potência que busca um homem por dez anos, encontra-o e, ato contínuo, mata-o sem julgamento?
A repercussão do fato na mídia faz ver o tanto de ilusão que absorvemos, fruto de uma sociedade não crítica, que acredita em tudo que ouve. Esquecemos de fazer perguntas básicas. Verdadeiramente, não teria sido possível encontrá-lo nesses dez anos? Quem mais matou na história humana, os EUA ou a Al Qaeda? Com essa morte o terrorismo chegou ao fim? È justa tal comemoração de uma vingança?
Seguramente, a morte de Bin Laden é mais que um símbolo [político / imperialista], não uma causa que possa produzir efeito vivificador. É um passo a mais na inqualificável separação entre oriente e ocidente, muçulmanos e cristãos, que são promotores e vitimas de seculares guerras.
Pensemos, no entanto, na morte esquecida de Cristo e na Sua vida não celebrada, aquela que foi causa da nossa salvação. O novo Adão não ressuscitou para si somente, mas para dar a vida por todos.
Que a Páscoa, que não se reduz a alguns dias, seja para cada um de nós, celebração da vida. E a vida se celebra a cada momento, sem deixar-se perder nenhuma gota do grande amor que Deus derramou nos nossos corações.

quarta-feira, 17 de novembro de 2010

Um olhar de fora, mas profundamente dentro (2)

No mês de setembro, quando estive no Brasil, encontrei a campanha eleitoral no seu auge: era uma guerra descomunal pelo poder. Eu sempre fui muito interessado ao desenvolvimento da política nacional e do Distrito Federal, daqui eu leio a cada dia as notícias, sempre fui assíduo e interessado eleitor, mas desta vez eu não votei porque deveria viajar a Milão (400 km ida e vinda) para transferir o título ao Consulado do Brasil e depois deveria ir a cada turno de votação.
O voto não é obrigatório na União Européia, aqui o voto é compreendido como um direito, e por isto a pessoa pode renunciá-lo. Isto tem produzido a pouca frequência dos eleitorer às urnas, na última eleição francesa somente 20% dos eleitores foram votar. Já no Brasil o voto é compreendido como um dever para com a democracia.
Confesso que experimentei uma certa alegria em não ter que votar. Somos uma nação pacífica, um povo amigável, mas quando é momento de eleição aparece o que temos de pior: tanta mentira, calúnia, raiva e corrupção que só mostra que o que está em jogo é o poder e os seus frutos. No fundo a ilusão é do eleitor que pensa estar escolhendo entre projetos diversos, mas fundamentamente estamos escolhendo pessoas diversas que têm em comum o interesse pelo poder e não pelo bem do povo.
Uma discussão que era muito presente era sobre a catolicidade dos candidatos, que diga-se: todos se tornam pessoas de fé e em geral católicas, numa nação de maioria católica. É uma “fé” oportunista, que usa Deus e a Igreja em função de um projeto de partido. Como corolário desta discussão veio aquela sobre o aborto. Partilho com vocês a realidade italiana sobre este tema: aqui o aborto é legalizado e pode ser feito na rede pública. Muitos médicos não o fazem por objeção de consciência e a surpresa é que o número de abortos clandestinos cresceu desde a legalização, foram cerca de 200 mil no ano passado. O motivo é para as pessoas que têm dinheiro é ainda cômodo não usarem a rede pública para manterem-se no anonimato. Dizer que a legalização diminui o número de abortos, se mostra como um argumento falacioso.
A principal preocupação que ficou no meu coração, como fruto desta eleição é a seguinte: temos uma carência de lideranças católicas-leigas para o mundo da política. Aprofundemos:
• Me parece equivocado buscar um candidato católico nas eleições. Muitas vezes não é o candidato que se diz católico que irá devender os valores do evangelho. É preciso olhar o compromisso pessoal do candidato e do seu partido com os valores do reino de Deus, e é preciso ver também que nem todo bom católico tem capacidade para ser bom político.
• Sou profundamente convencido que a política não é só lugar de corruptos, a crença na opinião contrária está fazendo com que o povo brasileiro, em especial os jovens, percam o interesse pela democracia que foi conquistada com o sangue e a vida de muitos dos nossos antepassados. Precisamos de garantir a presença de pessoas de valor no mundo da política.
• Na política a sedução pela fraude é muito presente, mais que em outros âmbitos. Daí é preciso que a comunidade cristã tenha a sabedoria de acompanhar com suas orações e com atos os seus eleitos: estas pessoas se vêem abandonadas e caluniadas pelos seus irmãos de fé. Não seria esta uma bela missão para a população de Brasília?
• A rejeição pela política tem feito com que este tema seja rejeitado nas nossas paróquias e isto é um equívoco, pois se o Evangelho é um anúncio de salvação para o ser humano, e este é por natureza político, logo o mesmo Evangelho deve tocar também este homem-político. Daí que devemos encorajar a comunidade cristã a assumir a vida política, precisamos de gente de fé que entre nas instituições políticas para transformá-las a partir de dentro. E nisto tenho a clareza que não precisamos de um partido da Igreja, pois nenhum partido pode esgotar todos os valores do Evangelho, opção partidária é questão de consciência pessoal. Precisamos de cristãos leigos que se façam presentes na diversidade dos partidos para levar a eles o valor do Evangelho. O triste que muitas vezes estes cristãos se perdem e se tornam mais partidários que pessoas de fé. Além disto, historicamente os partidos ditos “cristãos” não representaram os valores defendidos pela Igreja.
• A última eleição presidencial do Brasil foi muito marcada pelo disse-não-disse das TVs católicas e do episcopado. Eu nunca usei o meu ministério sacerdotal para pedir votos e não manifesto minhas opções a não ser para pessoas íntimas. Acredito que precisamos nos cuidar ao dar as nossas opiniões, pois muitas vezes os religiosos não são os mais capazes para emitir posições sobre política. Devemos dar fundamentos evangélicos e ser capaz de ver que a opção partidária é muito relativa, pois, como disse, nenhum partido esgota os valores do Evangelho e será que podemos ariscar o anúncio da Boa Nova para justificar um candidato?. O pior desta situação é que vemos clérigos ocupando lugar de leigos e leigos fugindo da vida social e política.
Enfim, celebrando nestes dias para a comunidade brasileira em Mantua, eu conclamei a assembléia para rezar pela nova presidente e por todos os eleitos. Alguns rostos faziam cara de desaprovação. Meus irmãos, a campanha acabou, resta-nos agora rezar pelos nossos governantes e cobrar deles o zelo efetivo pelo bem do Brasil, não só nesta geração, mas pensando também nas gerações futuras.
Basta. Falo muito. Abraços e bênçãos.
Até mais.

quarta-feira, 3 de novembro de 2010

Um olhar de fora, mas profundamente dentro (1)

Estive no Brasil no mês de setembro e vivi a maravilhosa experiência de viver com os meus familiares a amigos, a maioria eu não via há quinze meses. Foi pouco tempo para saborear o meu país e muito tempo para estar longe da vida de estudos, pois tenho que aproveitar o tempo de férias para ir reunindo material para a tese em liturgia.
Onde é a minha pátria? Quando as pessoas me perguntavam se estava ansioso para chegar no Brasil ou se vivo a saudade hoje, eu sempre digo assim: cheguei no Brasil quando o avião aterrizou e sai quando o avião decolou. Voltar a Brasília, depois de meses, era para mim a prova de fogo de meus sentimentos: ali vivi as minhas maiores felicidades e tristezas. Me perguntava como meu coração se moveria ao ver lugares e pessoas que me eram tão afins. Hoje, depois de voltar a Itália, lhes confesso: estou em paz, mas uma paz tão interessante que me possibilita dizer: nada, nem niguém a pode roubar. Estou sempre mais em casa na Itália, sem perder jamais meus laços com meu Brasil: sou brasileiro na Itália.
Na verdade existem duas coisas que eu sinto falta do Brasil: meus amigos (as) e a liturgia. De vez em quando eu fujo para celebrar para a comunidade brasileira de Mantova para matar a saudade e com os amigos eu busco sobreviver com os meios de comunicação, sobretudo internet. Descobrir estes sentimentos em mim era interessante, pois me foram fazendo perceber que fui sendo transformado em um ser humano normal: com sentimentos, amigos, inimigos, saudades, etc.
Quando falo da falta de amigos e da liturgia é porque nós, brasileiros que aqui estamos, vamos percebendo a riqueza da nossa igreja: uma liturgia viva, a participação ativa do laicato, a amizade, a alegria. Tudo isto não se vive na realidade italiana, e não porque é melhor ou pior, mas porque é diferente. Fundamentalmente, mesmo sem perceber isto claramente, o meu escasso apostolado me fez ter poucos e bons amigos leigos.
Esperei passar o fusuê das eleições (quanta poluição sonora e visual) para só depois escrever no meu blog. Na próxima vez quero compartilhar com vocês uma avaliação das eleições, olhadas por mim (profundamente brasileiro) a partir de fora (Itália).
Quero aqui agradecer muito, de coração a todos os meus amados amigos e amigas (incluída a minha família) pelas muitas e efusivas manifestações de amizade, carinho e proximidade nos dias que passei pelo Brasil. Confesso-lhes que faltou tempo para ver todos aqueles que eu queria e para conseguir atender todos os convites. Posso dizer que o resultado das férias foram 5 kg a mais no meu corpo e muitos, muitos quilos de amor e felicidade para meu coração. Deus lhes recompense sempre.
Abraços grandes.

domingo, 22 de agosto de 2010

Terra Santa ou Terra do Santo

Nestes dias eu tive a oportunidade de pelegrinar a Terra Santa. Hoje muitos entendidos preferem chamar de Terra do Santo, o verdadeimente Santo: Jesus. Usarei nos meus textos o nome mais popular Terra Santa.
Neste espaço buscarei dividir com vocês um tanto daquilo que experimentei nestes dias. Partimos de Verona no dia 12 de agosto e voltamos de Tel Aviv no dia 19 de agosto. Éramos 45 pessoas, sendo um brasileiro (euzinho mesmo), dois romenos e o restante era italiano. No grupo tinhamos seis sacerdotes e um frade, sendo que dos sacerdotes só um não era franciscano conventual.
Eu recusei por três vezes no Brasil o convite para ir a Terra Santa, pois vivia viajando e queria reservar esta experiência para os 25 anos de ordenação. Acontece que quando trabalhei organizando a biblioteca conventual de Camposampiero, encontrei as anotações de Provincial, Frei Gianni, para esta peregrinação, li e fiquei desejoso de fazer a experiência. Na visita de Gianni a Camposampiero eu lhe disse que um dia desejaria fazer este caminho com ele, e ele me disse venha na próxima, pois depois nao terei muito tempo.
Gianni é biblista que estudou também em Jerusalém. Já seguiu trinta grupos na Terra Santa. A cada ano ele organiza a seguintes peregrinações: Nas pegadas de Cristo, nas pegadas de Moisés e nas pegadas de São Paulo. Em cada lugar ele buscava o texto bíblico para explicar o que aconteceu ali, e acrescentava o aspecto histórico e arqueológico. A peregrinação foi de fato um retiro na Terra Santa.
Foi boa pelo lugar, pelo guia e pelo grupo, com quem estabeleci uma bela relação de convivência.
Tirei umas mil fotos, que estão no endereço: http://www.flickr.com/photos/frjoaobenedito/ e no meu orkut: fr.joaobenedito@gmail.
Nas semanas seguintes irei falar do que vi em cada dia de peregrinação.
Um beijo. Fiquem com Deus. Que Ele vos abençoe!
Frei João