domingo, 22 de agosto de 2010

Terra Santa ou Terra do Santo

Nestes dias eu tive a oportunidade de pelegrinar a Terra Santa. Hoje muitos entendidos preferem chamar de Terra do Santo, o verdadeimente Santo: Jesus. Usarei nos meus textos o nome mais popular Terra Santa.
Neste espaço buscarei dividir com vocês um tanto daquilo que experimentei nestes dias. Partimos de Verona no dia 12 de agosto e voltamos de Tel Aviv no dia 19 de agosto. Éramos 45 pessoas, sendo um brasileiro (euzinho mesmo), dois romenos e o restante era italiano. No grupo tinhamos seis sacerdotes e um frade, sendo que dos sacerdotes só um não era franciscano conventual.
Eu recusei por três vezes no Brasil o convite para ir a Terra Santa, pois vivia viajando e queria reservar esta experiência para os 25 anos de ordenação. Acontece que quando trabalhei organizando a biblioteca conventual de Camposampiero, encontrei as anotações de Provincial, Frei Gianni, para esta peregrinação, li e fiquei desejoso de fazer a experiência. Na visita de Gianni a Camposampiero eu lhe disse que um dia desejaria fazer este caminho com ele, e ele me disse venha na próxima, pois depois nao terei muito tempo.
Gianni é biblista que estudou também em Jerusalém. Já seguiu trinta grupos na Terra Santa. A cada ano ele organiza a seguintes peregrinações: Nas pegadas de Cristo, nas pegadas de Moisés e nas pegadas de São Paulo. Em cada lugar ele buscava o texto bíblico para explicar o que aconteceu ali, e acrescentava o aspecto histórico e arqueológico. A peregrinação foi de fato um retiro na Terra Santa.
Foi boa pelo lugar, pelo guia e pelo grupo, com quem estabeleci uma bela relação de convivência.
Tirei umas mil fotos, que estão no endereço: http://www.flickr.com/photos/frjoaobenedito/ e no meu orkut: fr.joaobenedito@gmail.
Nas semanas seguintes irei falar do que vi em cada dia de peregrinação.
Um beijo. Fiquem com Deus. Que Ele vos abençoe!
Frei João

quinta-feira, 5 de agosto de 2010

Uma experiência inesquecível

Na comunidade onde moro, reside o capelão do hospital de Camposampiero. Nestes dias ele tirou férias e eu tive a oportunidade de substitui-lo do dia 18 ao dia 31 de julho e voltarei lá nos dias 22 a 29 de agosto.
Desta vez irei fazer uma especie de entrevista comigo mesmo, para dizer como foi a experiência de ser capelão num hospital público no norte da Itália.
Como funciona a saúde na Itália?
A Itália tem uma grande diferença sócio-econômica entre norte e sul, eu estou na região rica do norte. Aqui a saúde depende de cada região. No Veneto o sistema público é tão bom que não existe lugar para o sistema privado.
Eu tive que usar o hospital primeiro como paciente, e funciona assim: você vai ao seu médico de base e ele te encaminha para a clínica especializada. O médico de base trabalha em clínica fora do hospital, e pode ser procurado de segunda a sexta-feira. De posse do encaminhamento a pessoa marca o exame por internet, telefone ou no hospital. Se paga uma taxa por cada exame, que varia, mas para uma consulta é algo em torno de R$ 30,00.
Na minha cidade tem um hospital superdimensionado. Em uma população de seis mil habitantes, ele tem 8 andares, com cerca de mil leitos. É impecavelmente limpo, bem mantido e nunca o encontrei cheio. Recordo que ele pode ser usado, e é, pelas cidades vizinhas, mas existem muitos bons hospitais na região.
Uma coisa me chama a atenção: a fama dos profissionais de saúde no Brasil é de serem estressados, aqui eles são tão tranquilos e gentis, que destoa daquilo que existe fora dos hospitais.

Qual o trabalho do capelão?
A Itália é para mim uma sociedade invejável no senso que aqui vejo que, muito mais que no Brasil, há uma integração entre fé e cultura, mesmo que seja uma sociedade secularizada e com baixo percentual de frequência na igreja.
A Igreja da Itália leva com muita seriedade o trabalho nos hospitais. Aqui neste hospital a equipe é constituída por um sacerdote, um diácono e uma religiosa, sinto sempre falta de leigos (as) na pastoral italiana, muito marcada pela presença do clero. O sacerdote está no hospital todos os dias das 8 as 20 h, e quando não está, o celular fica disponível para o caso de emergência: morte e terminal. Eu fui chamado neste tempo duas vezes a noite para defuntos: a meia-noite e às 2:27 h.
Todos os que estão internados no hospital têm a possibilidade de receber a cada dia a comunhão e de solicitar unção e confissão. Tem a cada dia o rosário e a missa.
Quando acontece um óbito, aqui que é ainda mais diverso do Brasil, na hora a família chama o capelão que faz a primeira parte da encomendação. O corpo fica três dias na geladeira, por burocracia italiana. Ao final deste período, o pároco vem para acompanhar o corpo para a missa no cemitério ou na paróquia, e ele celebra a última parte da encomendação. Isto é possível porque as paróquias do Veneto são pequeníssimas.

O que significa isto para mim?
Aprendi com o sofrimento que a única possibilidade de humanização é a cruz: sem esta experiência nós somos iludidos sobre nós mesmos, os outros e Deus. É o sofrimento que nos faz humanos, ou melhor, ele tem uma força de nos fazer crudelíssimos ou nos converter.
Durante estes dias no hospital eu estava lidando todo o tempo com o limite da situação humana: dor, doença e morte. Encontrei pessoas com diversas histórias de vida, mas profundamente abertas. Que aprenderam a sorrir e a ter desejos simples.
Um homem me dizia assim, mostrando as fotos com os grandes do mundo: ele era chefe-militar do palácio presidencial em Roma, muito rico e cercado de pessoas. Acreditava ter poder e amigos. Hoje está numa ala de pacientes terminais, com câncer. Concluía: Deus foi o único amigo que me sobrou de fato e tudo aqui que vivi antes foi ilusão.
Já uma mulher, que aceitava a comunhão, mas não aceitava a confissão, me dizia: se alguém tem que se confessar comigo é Deus – Ele sempre me perseguiu, me fez viúva aos 28 anos, me deu um câncer e uma mestátase. Ela foi sincera comigo, e desde aquele dia eu a visito todo dia, com uma missão: possibilitar àquela paciente terminal de fazer a experiência do amor de Deus.
O hospital é isto: não tem tempo, não tem hora. Tudo pode acontecer. Mas você se encontra com a humanidade na sua forma mais simples: sem as ilusões que temos sobre nós mesmos, nos nossos limites e com a possibilidade de um encontro sereno com o Senhor.
Em resumo:
Quando me diziam que eu fazia bem a eles eu pensava e às vezes dizia: vocês é que me fazem bem. Eu só sorria, conversava e oferecia sacramentos. Eles me deixaram impressas algumas convicções que vou somando na minha vida: a vida humana é algo muito mais simples que nossos devaneios.
Diante daqueles corpos envelhecidos e doentes, mas que continham um espírito vigoroso, eu pensava: como somos pequenos, só vale a pena usar estes poucos anos para Deus e os irmãos, o resto é ilusão.
Partilho com vocês porque creio que tenho o dever de narrar esta experiência bela para vocês, seja para lhes envolver ou, melhor, para lhes encorajar a fazer o mesmo.
Fiquem com Deus!
PS: parto para terra santa no dia 12 de agosto, ali estarei por uma semana.